Do medievalismo a vida noturna em Cracóvia

Aconteceu em 3 de Junho de 2016.

St. Florian's Gate
Devido ao cansaço na noite anterior eu me permiti dormir um pouco mais no meu segundo dia em Cracóvia. Como café da manhã eu comi aquele pãozinho que comprei em Berlim com uma manteiga que tinha na mochila, uma mistura um pouco seca, porém gostosa. Saudades do café do manhã do hostel!

Com minhas energias recuperadas, e pronto para uma caminhada, me coloquei a andar para o Old Square novamente. Em Cracóvia não é permitido beber na rua, mas não há nenhuma regra contra o cigarro. O resultado? Muita gente fumando na rua, principalmente jovens. Este é um reflexo do lobby das indústrias, e mostra claramente qual delas é a mais influente aqui.

No Old Square caminhei para o extremo norte para o St. Florian’s Gate, onde começaria a tour. Acabei chegando uns minutos atrasado, mas consegui pegar a essência da introdução. Havia um grupo grande de pessoas participando, algo em torno de vinte a trinta. Nossa caminhada foi muito rica em detalhes e cheia de lendas e história. Cracóvia anteriormente era a capital Polônia, e por isso já foi morada de reis e palco de muitos acontecimentos na história. Por falar em reis nos sentimos da nobreza ao atravessar o portão St. Florian’s, anteriormente usado apenas pelos mesmos. Sua gigantesca muralha e torres de vigia no estilo gótico eram apenas um resquício do que já fora a muralha do Old Square.

Casa dos Bispos
Em seguida passamos pelo museu nacional, que continha a famosa obra “Dama com Arminho” de Leonardo da Vinci (a Mona Lisa da Polônia). O museu estava em reforma e não podemos entrar. A obra fora movida para o Castelo Wawel para exibição do público. Então continuamos rumo ao Market Square, mas agora com uma perspectiva histórica. Por já ter sido alvo de ataques e fogo, o Mercado fora reconstruído algumas vezes. Assim, há uma mistura de estilos gótico e renascentista na arquitetura, fruto da moda em cada época. O último arquiteto a restaurar o Mercado tentou buscar uma inspiração nova para a obra. O dia todo havia se passado e ele ainda estava com um bloqueio mental. Foi na calada da noite que, vendo as pessoas bêbadas e brigando entre si, ele encontrou a sua inspiração: os entornos na fachada do Mercado foram baseados em rostos de pessoas bêbadas, e funcionou incrivelmente bem.

Na Basílica de Santa Maria (principal igreja da cidade) era hora do trompeteiro entoar sua música. Isso acontecia a cada hora, 24 hrs por dia. O engraçado é que, certa vez, um guia turístico que estava entediado disse a um turista que aquele trompetista era uma homenagem a um homem que morreu com uma flechada avisando da invasão de inimigos do alto da torre. O turística ficou tão impressionado que seu livro sobre Cracóvia chamou-se "O Trompetista de Cracóvia". Os poloneses decidiram se aproveitar da história e o trompete se popularizou.

Entrada do Wawel Castle
Em seguida fomos para a Universidade Jagiellonian, a mais antiga faculdade da Polônia ainda em funcionamento, e uma das mais antigas do mundo. Fundada em 1364 pelo Casimir, o Grande, na intenção de fazer uma Polônia uma terra de pessoas educadas.  Para ser aceita pelo papa na época, a instituição também ministrava cursos de teologia.

Por falar em papa também passamos pela tradicional Casa dos Bispos, que como o nome diz é a morada dos mesmos. Este lugar ficou famoso, pois certa vez, numa visita a Cracóvia, João Paulo II também se hospedou no lugar. Os fiéis da cidade se reuniram do lado de fora em grande número e esperaram por horas pela chance de ver o papa. Então num gesto de humildade, João Paulo II apareceu na janela central da Casa, e começou a conversar num tom bem informal com eles. Eles cantaram, dançaram, e conversaram por horas e horas, e este alegre momento virou uma tradição papal bem descontraída. A foto de João Paulo II foi gravada na mesma janela. A nossa guia até brincou dizendo: aqui as pessoas amam mais João Paulo II do que se Jesus Cristo.

Catedrais no Wawel Castle
Nossa caminhada estava chegando ao ponto mais esperado: o Castelo Wawel! Ao longe já era possível contemplar sua majestosidade do castelo, com suas muralhas imponentes. A história por trás da construção conta que em período de crise financeira e querendo renovar a área em volta do rio, foi feito o projeto do castelo. Devido à escassez de recursos, fizeram uma campanha para que as pessoas ajudassem nas obras. Toda pessoa que doasse um dia de seu trabalho teria o seu nome gravado no castelo. Então pessoas do mundo todo quiseram deixar seu nome na história e ajudar nesse lindo projeto. Seus nomes estão por toda parte na rampa de entrada do castelo, em belas plaquetas de metal.
Enquanto subia a rampa, novamente tive aquela sensação de poder fechar os olhos, e todos aqueles turistas sumiam. Na minha cabeça podia ouvir cavaleiros subindo a larga rampa em um galope acelerado. Sempre me encantei por histórias medievais, mas até então nunca tinha visto um castelo pessoalmente. Eu olhava cuidadosamente cada detalhe enquanto entrávamos: do portão de madeira às pedras da passarela, tudo fora colocado daquela forma para facilitar a defesa do castelo.

Do lado de dentro o castelo parecia-se com um parque, com jardins, Catedrais, palácios, e etc. Como ele fora feito por diversas pessoas diferentes, havia um curioso conjunto de quatro Catedrais construídas com diferentes estilos arquitetônicos, que não combinam nada entre si, mas mostram como as pessoas queriam "deixar sua marca" naquele local.

Conhecemos também o Royal Private Apartments e o palácio onde estava sendo exibida a obra “Dama com Arminho” de Leonardo da Vinci que mencionei antes. Também aprendemos sobre a lenda do dragão de Cracóvia (um símbolo da cidade). De cima do castelo era possível ver a estátua do dragão no rio, que a casa dez minutos cuspia fogo para cima para alegrar os turistas. Resumindo a lenda: o dragão aterrorizava a cidade e atacava as virgens. Depois de os mais bravos guerreiros falharem em derrotá-lo, um sapateiro se ofereceu para desafiar o dragão e conseguir a mão da filha do rei. Ele colocou muito sal e pimenta envolto em lã para parecer uma ovelha, e deixou a isca perto da caverna do dragão. Quando o dragão comeu todo aquele sal e pimenta, sentiu uma enorme sede e foi beber a água do rio. Porém ele bebeu tanta água, mas tanta água, que morreu. O sapateiro virou um herói. Moral da história: beba cerveja, não beba água. Isso pode te matar.

E foi nesse clima descontraído que nossa tour teve fim. Aplaudimos nossa guia e peguei um mapa muito legal com dicas da cidade e alguns descontos de parcerias com a agência. Aproveitando um desses descontos, agendei meu passeio para conhecer Auschwitz para o dia seguinte. Até paguei um pouco mais caro do que já tinha visto na internet, mas pelo menos tive ótimas recomendações.
Já era fim de tarde e eu estava com fome, então com o meu novo mapa consultei um lugar com comida típica Polonesa e fui para lá. O restaurante se chamava Polakowski, e era muito bonitinho no interior. Pegando o cardápio em inglês, naturalmente o que nos chama a atenção são os stakes e as batatas, pois são palavras conhecidas. Mas eu não queria mais do mesmo, queria algo polonês. Então pedi ajuda de moradores locais para recolher algo legal, e me recomendaram muito o Bigos, também conhecido como guisado de caçador. Como acompanhamento, segui o conselho da atendente e pedi uma sopa de beterraba com batata, e batatas bolinha assadas. Eu também ganhei um suco que eu acredito ser de hibisco, mas não tenho certeza. E toda essa mistura diferente no final realmente foi uma delícia.

O Dragão de Cracóvia
No caminho para a casa passei em uma grocery store e comprei Iogurte, salame, bolacha Bel Vita (que é diferente e mais gostosa do que a vendida do Brasil) e uma cerveja Stout Paulaner, para dividir com meu anfitrião. Quando cheguei recebi uma mensagem do Konrad que haveria um evento na proximidade para Start Ups, com cerveja inclusa. Ele me mandou o endereço e rapidamente tomei um banho e já fui para o lugar. Para a minha sorte eu tinha levado uma camisa sport fino para não parecer totalmente um peixe fora d’água.

Eu cheguei já no final do evento, mas foi muito legal finalmente conhecer meu anfitrião e interagir com alguns de seus amigos. Tomamos ótimas cervejas e tivemos conversas muito interessantes. Todos os envolvidos lá são empreendedores cheios de ideias inspiradoras, e até me questionavam em bom humor o que um comprador de suprimentos fazia naquele local.

A noite ótima e fizemos a nosso próprio “pub crawl”, passando pelo bar “Komisariat” e outro que eu não me recordo o nome. Nesta noite também conheci Monia e Aneta, couchsurfings que ficariam no Konrad também, e vieram de Varsóvia (Polônia). Tivemos ótimos momentos e conversas divertidas, e outra amiga me ensinou que existe um termo chamado Polish Ausgang (Saída Polonesa), que se refere a como os poloneses deixam uma roda de amigos sem se despedir. Os alemães acham isso rude, mas os poloneses acreditam que não vale a pena interromper uma conversa de amigos para anunciar que estão saindo.

Nesse clima Polish Ausgang eu algumas vezes me perdia das pessoas, pois elas realmente não avisavam para onde iam e etc. Mas quando nos reencontramos, já meio bêbados, pegamos um tram para o apartamento de Konrad. Ele estava com a perna machucada e andava com dificuldade.

Agora a casa estava cheia. E eu, bem alegre e cansado da agitação, começava a me organizar para o dia seguinte. Meu segundo dia em Cracóvia de fato tinha compensado muito pelo pouco que aproveitei do primeiro. Tinha aprendido muito da história do lugar, e curtido em grande estilo a vida noturna com pessoas muito interessantes. Talvez não estivesse emocionalmente pronto para o que viria a seguir, mas pelo menos aprontei o meu despertador... Amanhã acordaria cedo para fazer uma tour até Auschwitz. Honestamente sabia que seria um passeio diferente, mas não saiba o que esperar. Só me restara mesmo encostar a cabeça no travesseiro e descansar, e deixar que o despertador me acorde no dia seguinte... ou não!?!?

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